Único a votar na sessão desta quinta-feira (4), o ministro Dias Toffoli entende que a restrição à veiculação de informações verdadeiras é vedada pela Constituição.
O ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, votou, nesta quinta-feira (4), pelo desprovimento do Recurso Extraordinário (RE) 1010606, em que se discute o direito ao esquecimento na área cível. Para o relator, a ideia de poder obstar, em razão da passagem do tempo, a divulgação de fatos ou dados verídicos é incompatível com a Constituição Federal de 1988, e eventuais excessos ou abusos devem ser analisados caso a caso, a partir dos parâmetros constitucionais. O julgamento prosseguirá na próxima quarta-feira (10), com os votos dos demais ministros.
Por meio do recurso, familiares da vítima de um crime de grande repercussão nos anos 1950 no Rio de Janeiro buscam reparação pela reconstituição do caso, em 2004, no programa “Linha Direta”, da TV Globo, sem a sua autorização. Após uma tentativa de estupro, a vítima foi arremessada de um edifício em Copacabana. O recurso motivou o relator a convocar uma audiência pública, em junho de 2017.
Liberdade de expressão
Único a votar na sessão de hoje, o ministro Dias Toffoli destacou que a veracidade da informação e a licitude da obtenção e do tratamento dos dados pessoais são relevantes para a análise da legalidade de sua utilização. Para ele, um comando jurídico que estabeleça o tempo como restrição à divulgação de informação verdadeira, obtida licitamente e tratada adequadamente precisa estar previsto em lei, de modo pontual e claro. “Não pode ser fruto apenas de ponderação judicial”, observou.
Segundo Toffoli, admitir o direito ao esquecimento seria restringir, de forma excessiva e peremptória, as liberdades de expressão e de manifestação de pensamento dos autores e o direito de todo cidadão de se manter informado a respeito de fatos relevantes da história social. Essa possibilidade, conforme o ministro, “equivaleria a atribuir, de forma absoluta e em abstrato, maior peso aos direitos à imagem e à vida privada, em detrimento da liberdade de expressão”. Toffoli destacou que a liberdade de expressão é um direito humano universal e condição para o exercício pleno da cidadania e da autonomia individual.
Coletividade
Segundo o relator, o artigo 220 da Constituição Federal coloca a liberdade de informação jornalística a salvo de qualquer embaraço por meio de lei e explicita que as balizas ao exercício dessa liberdade se restringem aos casos prescritos na própria Constituição. Assim, como regra geral, não são admitidas restrições prévias ao seu exercício.
O ministro lembrou que o STF tem construído jurisprudência consistente em defesa da liberdade de expressão, que deve ser exercida em harmonia com os demais direitos e valores constitucionais, de modo a não alimentar o ódio, a intolerância e a desinformação. Segundo Toffoli, a ponderação em relação ao direito ao esquecimento envolve toda a coletividade, que será cerceada de conhecer os fatos em toda a sua amplitude.
Tragédia familiar
Em relação ao caso concreto tratado no RE, o relator entendeu que, embora constituam uma tragédia familiar, os fatos divulgados são verídicos, fazem parte dos casos notórios de violência na sociedade brasileira e foram obtidos licitamente na época de sua ocorrência. “O decurso do tempo, por si só, não torna ilícita ou abusiva sua divulgação, ainda que sob nova roupagem jornalística, sob pena de se restringir, desarrazoadamente, o exercício, pela emissora, do direito à liberdade de expressão, de informação e de imprensa”, afirmou.
Ele também entendeu que não foram violados direitos da personalidade, pois não houve divulgação desonrosa à imagem ou ao nome da vítima ou de seus familiares. “Os fatos narrados no programa, lamentavelmente, são verídicos”, ressaltou, e as imagens reais usadas na exibição foram obtidas legitimamente. De acordo com o relator, todos os crimes são de interesse da sociedade, mas alguns, por seu contexto de brutalidade, tornam-se objeto de documentação social e jornalística. “Sua descrição e seus contornos são alvo de farto registro que, em princípio, não violam a honra ou a imagem dos envolvidos”, observou.
A seu ver, o programa cumpre, ainda, o papel jornalístico de promover questionamentos jurídico-sociais importantes, sobretudo quando considerado que debates sobre a violência contra a mulher têm fomentado a edição de normas mais rigorosas para esses casos.
Biografias
Como exemplo sobre a ponderação dos valores constitucionais em discussão, o relator citou o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4815, em que a Corte afastou a exigência de autorização das pessoas envolvidas em relação a obras biográficas. No caso de fundo do RE, Toffoli observou que, embora o recurso não trate, propriamente, de biografia audiovisual, mas de programa jornalístico com reconstituição dos fatos por atores, que mescla documentação de época com a apresentação da história da vítima, o mesmo fundamento pode ser aplicado.
Fonte: Notícias STF
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